30 janeiro 2007

Cofre guarda nos Açores exemplar raro de 'Os Lusíadas'

Por Ruben Medeiros
em Lusa
21 janeiro 2007

Um cofre climatizado guarda uma das principais raridades do acervo da Biblioteca Pública de Ponta Delgada (Arquipélago dos Açores): um dos seis exemplares da primeira edição de "Os Lusíadas" (foto), de 1572, e que permanece desconhecido do grande público.

Diante de sua raridade e valor histórico, a obra maior do poeta luso Luís Vaz de Camões, que narra os feitos dos descobrimentos portugueses, está "cercada de cuidados", explicou, à Agência Lusa, Francisco Silveira, o responsável pelas coleções particulares da única biblioteca nos Açores a dispor de um exemplar tão raro da obra.

Sem nenhum pedido de consulta em 2006, esta edição de "Os Lusíadas" tem sido, ao longo dos anos, apenas solicitada por pesquisadores e estudiosos, a maioria dos quais professores universitários.

Apesar da fragilidade, o livro, de 18 centímetros de altura, editado em Lisboa, "está em bom estado de conservação", assegurou Silveira, ao adiantar que o exemplar poderá ser consultado pelo público, mas com certas regras a cumprir.

Composto por dez cantos, 1.102 estrofes e 8.816 versos, a obra pode ser consultada depois de preenchida uma ficha, como acontece com os outros livros da biblioteca, embora o requerente tenha de justificar, por escrito, o propósito da consulta.

"O objetivo de uma biblioteca é facultar o acesso a todos os documentos e livros que a instituição possui, claro que com regras mais rígidas para edições mais importantes", afirmou Silveira.

DESCONHECIMENTO

Apesar de disponível, é, ainda, "rara" a requisição desta edição de "Os Lusíadas" nos Açores, por desconhecimento de sua existência em Ponta Delgada.

Um desconhecimento que não incomoda o responsável pelas coleções particulares da Biblioteca Pública, até porque o local não implementou ainda a utilização de luvas para manusear os livros mais valiosos ou de maior interesse histórico de seu acervo.

Silveira explica que a transpiração pode deteriorar o papel, e que por isso há de se ter "mil e um cuidados" quando alguém requisita esta edição rara da obra portuguesa, publicada três anos após o retorno de seu autor do Oriente.

A primeira edição de "Os Lusíadas" faz parte dos cerca de 18 mil títulos da biblioteca pessoal de José do Canto, que reúne livros do século 15 ao 19, adquiridos em maio de 1942 pela instituição.

"Trata-se de uma das mais valiosas coleções privadas, seja pela raridade das espécies bibliográficas ou pela coleção camoniana, considerada por especialistas a segunda maior em nível nacional", afirmou Francisco Silveira.

OBRAS CONTEMPORÂNEAS

A coleção particular do bibliófilo dos Açores contém quase todas as primeiras edições de autores portugueses contemporâneos como Alexandre Herculano, Antero de Quental, Camilo Castelo Branco e Eça de Queirós, e alguns estrangeiros, como Darwin e Dumas (pai e filho), indicou.Além disso, a coleção camoniana de José do Canto reúne todas as edições de "Os Lusíadas" editadas em Portugal até 1898, ano da morte do autor.

"No total são cerca de 110 edições portuguesas, publicadas entre 1572 e 1892", disse Silveira, acrescentando que a coleção inclui, ainda, cerca de 105 edições estrangeiras, traduzidas em húngaro, alemão, inglês, francês, italiano, espanhol, russo e japonês.

Este acervo bibliográfico de grande valor histórico foi reunido ao longo dos anos, fruto dos contatos que José do Canto manteve com vários colecionadores na França e na Inglaterra.

Para facilitar e generalizar o acesso das obras mais consultadas e de maior valor histórico, a Biblioteca Pública de Ponta Delgada está digitalizando seus títulos, em um serviço que deverá ser disponibilizado, parcialmente, ainda este ano.

INTERNET

Na página da instituição na Internet, os visitantes vão poder, também no futuro, pesquisar o arquivo digital e conhecer as coleções particulares que compõem o acervo da biblioteca da maior cidade açoriana, que já conta com 2.850 usuários com cartão de leitor.

A Biblioteca Pública de Ponta Delgada conta com mais de 110 mil títulos, provenientes de coleções privadas e de conventos, com mais de 85 mil obras devidamente catalogadas.

"A Biblioteca está entre as quatro maiores do país devido à raridade dos títulos de que dispõe", afirmou Silveira, ao destacar um livro de Fernão Lopes da Castanheda, de 1551, que conta a história dos descobrimentos e conquistas portugueses na Índia e que não está na Biblioteca Nacional, em Lisboa.