12 julho 2007

Memórias clandestinas

Por Aldo Barreto

A densidade dos ritos de informação corresponde a qualidade do saber acumulado na memória. Representa um conjunto de atos contínuos, que se acrescentam no tempo; obras pelo qual o indivíduo reelabora o seu mundo modificando o seu espaço, uma criação em convivência com o passar do tempo.

A densidade da memória é agregativa e aderente e não se separa do todo de uma qualidade conquistada. Isto é o que faz ser, completamente diferente, o pensar de um homem de cinqüenta anos e de outro de cinco anos.

A interatuação do sujeito, com os seus estoques de memória, potencializa o espectro temporal de seu destino indicando que existem tempos distintos para configurar as moradas da memória e uma esperança de que esta memória depois de formalizada possa transformar as realidades existentes.

Deriva daí a importância das residências da memória.

No tempo do computador pessoal dizemos: vou entrar em um arquivo indicando a idéia de viagem e permanência no local da informação e esta possibilidade de ingresso mostra a circunstância de serena espera da memória para possibilitar uma ação maior.

Entrar em um arquivo é desvendar castelos em labirinto onde o viajante não pode nunca olhar de cima para baixo, como um ser avoante e ver as tramóias e os os caminhos certos para a informação desejada. Há que se percorrer todas as alamedas para conhecer o labirinto da memória.

Estes arquivos potencialmente armazenados em estoques acumulam-se exponencialmente em estruturas que lhe servem de repositório. Mesmo com filtros naturais na entrada para limitar qualitativamente o crescimento do estoque, a coisa toda poderá tombar devido ao seu próprio peso, a menos que se modifiquem, pelo deslembramento, as proporções relativas da estrutura em relação ao seu conteúdo.

O estoque de memória nos traz à imaginação questões da memória e do esquecimento. É necessário domiciliar parte de nossa memória para abrir espaço. Pensamos, então, na condição do não esquecimento das memórias clandestinas, ocultas por razões sociais de certa contemporaneidade e por isso não conseguem um domicílio instituído, o que possibilitaria o esquecimento.

Não podemos treinar a deslembrar como treinamos o aprimorar de nossa memória. Mas o esquecimento é uma qualidade da memória, que a preserva e a mantém saudável. Nossa memória funciona, e só funciona porque nos é dada esta capacidade do esquecimento.

A mente humana, quando em seu sentido de justiça tem a irracionalidade dos fantasmas, que assombram e afastam uma realidade falsamente construída.

As Memórias clandestinas por pressão ou opressãonão podem ser esquecidas e precisam ser recontadas como uma lenda. Como a lenda as lembranças clandestinas tem um percurso de passos delirantes sem destino certo e explicações fáceis: é como um percorrer de labirintos de medusas entrelaçadas.

Lenda porque, nestas memórias emaranhadas, versões se agregam pela narração de diferentes indivíduos seguindo caminhos alternativos e com diferentes intenções. Memórias clandestinas são lendárias, pois, qualquer seja o seu núcleo de intenção, representarão sempre a soma do que delas se diz de acordo com os diferentes enunciados.